Católicos e protestantes empreendem esforços para construir a paz
IRLANDA
Por Cloé Chapeau
BELFAST, 27 de março (ALC) - Mais de 80 anos de história e conflitos fecharam um capítulo de violência e dor, quando ontem, pela primeira vez na história, o ancião líder protestante Ian Paisley reuniu-se com o líder católico do “Sinn Fein”, Gerry Adams. Do encontro surgiu um pacto de paz e reconciliação que os levará a governar juntos o país a partir do dia 8 de maio.
O novo capítulo, que se espera ponha fim ao conflito entre católicos e protestantes que matou mais de 3 mil pessoas em 30 anos de conflito, começou a ser elaborado em outubro de 2006, quando os governos britânico e irlandês apresentaram um plano para restaurar o autogoverno, batizado como acordo de Saint Andrews, e que fixou o dia 26 de março de 2007 como data limite. Aceitado pelos partidos do Ulster, o acordo exigia que o Sinn Fein aceitasse a autoridade da polícia (PSNI) e da Justiça da Irlanda do Norte - o que fez no dia 28 de janeiro- e o Partido Democrático Unionista (DUP) a candidatura de MacGuinness (líder do Sinn Fein).
Quando no dia 7 de março a Irlanda do Norte foi às urnas para eleger a composição da futura Assembléia autônoma sem a sombra das armas do IRA, o avanço foi considerado muito importante.
O DUP, do reverendo Ian Paisley, venceu as eleições autonômicas do Ulster, ao conseguir 36 das 108 cadeiras que compõem a Assembléia legislativa e 30,1% dos votos. O Sinn Fein, de Gerry Adams, ficou em segundo lugar, ao obter 28 cadeiras.
Na entrevista coletiva que concederam ontem, os dois líderes sentaram-se juntos mas evitaram olhar-se e saudar-se. O reverendo presbiteriano de 80 anos, inimigo incondicional do catolicismo durante décadas, qualificou o pacto como uma "enorme ocasião" para a paz. Ainda assim, não encontrará facilidades no convencimento de setores muito conservadores de seu partido quanto a pontos práticos do acordo. O fato de ter pedido um tempo mais para a implementação do acordo dá lugar a especulações.
Adams, que é reconhecido como um grande estrategista, disse que o acordo conseguido “marca o princípio de uma nova etapa política” para a Irlanda do Norte. O líder católico concedeu as duas semanas que Paisley pediu para dar início de fato ao pacto, quando sua linha política esperava que o pacto começasse ontem mesmo. Adams é considerado um histórico membro do ex-Exército Republicano Irlandês (IRA), ainda que ele negue a participação em vários comentários e notas. Vale a pena ler sua autobiografia intitulada "Antes do amanhecer".
O acordo repercutiu em toda a Europa, já que Paisley é qualificado como um "duro", um homem intransigente quando se trata de separar por religiões o mundo onde vive. Ele é chamado de Doutor Não pela mídia do continente. O Diário EL País, da Espanha, relatou assim o histórico encontro:
- O homem que em 1959 animava habitantes do enclave protestante de Shankill a expulsar de ali aos católicos; o homem que em 1962 abandonou a Ordem de Orange porque esta decidiu não expulsar um membro por ter assistido a uma missa católica; o homem que em 1964 provocou dois dias de distúrbios em Belfast ao exigir da polícia que retirasse a bandeira irlandesa da sede do Sinn Fein; o homem que em 1971 fundou o Partido Democrático Unionista (DUP) porque o partido unionista dominante não lhe parecia bastante radical; o homem que foi expulso do Parlamento Europeu em 1988 por chamar o papa João Paulo II de "anticristo"; o homem que em 1998 renegou os Acordos das Sextas-Feiras Santas e que chamou a rainha Elisabeth II de “papagaio de Tony Blair” por engrandecê-lo em público; o homem que tantas vezes disse que "nunca, nunca, nunca" pactuaria com os republicanos; o homem conhecido como Doutor Não, ontem disse sim.
O premiê britânico, Tony Blair, assegurou, ao inteirar-se do acordo, que era "um dia muito importante para o povo da Irlanda do Norte, bem como para o povo e a história dessas ilhas". O governo britânico confirmou na semana anterior que destinará 53.000 milhões de euros adicionais ao gasto público na Irlanda do Norte.
Nascido em 6 de abril de 1926, em Armagh, o reverendo Ian Richard Kyle Paisley foi ordenado pastor aos 20 anos, depois de realizar estudos de Teologia no South Wales Bible College. Moderador da Igreja Livre Presbiteriana do Ulster, da qual é fundador, Paisley é qualificado como um conservador irredutível.
Seus defensores crêem que a aceitação do acordo é parte de uma espécie de “conversão” do líder ancião, que vê a necessidade da paz depois de tantos anos de lutas. Seus detratores duvidam e simplesmente dizem que ele está chegando ao final da vida e não quer deixa-la sem ter sido governo na Irlanda.
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Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação
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