18 março, 2007

A tradição metodista e seus novos rumos

Por Eduardo Jedliczka

Caro leitor, imagino que julgue-me por saudosista ou ingênuo, mas confesso que estou realmente preocupado com os rumos de nossa igreja. É inegável que os tempos mudam, a cultura muda, ventos de doutrinas vêm e vão, visões passam, movimentos hereges e ortodoxos ocorrem vez ou outra, mas a Igreja, Corpo de Cristo permanece. A palavra de Deus não muda e Suas misericórdias continuam se renovando a cada manhã!

Sabemos que o Metodismo possui raízes fortes e grande herança para lidarmos de forma sábia e equilibrada com a realidade atual, seja ela brasileira ou mundial. Wesley foi um homem inspirado por Deus que deixou um legado sólido, firme, baseado na compreensão e amor ao próximo. Ele cravou na história a importância e necessidade das questões sociais, do avivamento, da reforma contínua, do discipulado, deixou exemplos da estrutura em células, isto sem contar toda a boa literatura produzida, e a parceria na composição de hinos.

Como prova disto, quantos de nossos pastores e bispos foram convidados a falar para platéias presbiterianas, assembleianas, batistas, etc... sobre a forma de governo e a estrutura da Igreja Metodista? Quantos membros de outras denominações consideram utópicas coisas simples como “voz e vez”, ou “delegados leigos ao concílio”? Quantas denominações têm coragem de falar abertamente sobre ecumenismo, acreditando que isto faz parte da pluralidade de dons e ministérios no Corpo de Cristo, não distinguindo entre aqueles que são de Paulo, Pedro ou Apolo, pois entendem que, mesmo diferentes, todos pertencem a Cristo? Quantas denominações chegaram a ousar falar em evangelho integral, em reforma agrária, ou se posicionar diante de um plebiscito ou eleição?

Sim, acredito numa igreja viva, com riqueza e importância histórica. Por isto, não consigo entender como o ideal (escada) do “ganhar, consolidar, discipular e enviar” pode acrescentar algo positivo sem castrar parte de nossa identidade. Não consigo entender como a criação de castas (pré-encontro, encontro, pós-encontro, reencontro, nível 1, etc...) possa fortalecer o amor e comunhão entre irmãos.

Muitas igrejas, mesmo que suas denominações apóiem ou sejam contra, têm provado desta escada, sempre passando por inúmeras transformações. É inegável que algumas têm sido grandemente abençoadas, da mesma forma que outras têm mantido as estatísticas de crescimento, mas não podemos negligenciar o percentual daquelas que têm encontrado divisões, problemas, dificuldades e a perda de sua identidade.

Atualmente há muita literatura comparando a fé a um produto e um templo com um supermercado.

Ao explorarmos apenas didaticamente esta ilustração, poderíamos apresentar conceitos como a existência de consumidores diferentes. Mas a cada dia, mais e mais, os vários mercados têm se tornado extremamente semelhantes. Parece que um grande atacadista está comprando ou influenciando os concorrentes, sejam eles da Rede A, B, C ou D...

Assim, imagino qual será o futuro daquele consumidor que gosta do mercadinho de vila que ainda vende fiado, onde faz tranqüilamente suas compras e fica por horas conversando com outros consumidores, seja por respeito, por amizade, ou até por amor. Qual será o impacto na vida dos consumidores que apenas podem escolher entre a impessoalidade ou tratamento ISO 9001 desta nova safra de mercados? Onde fica o atendimento personalizado ou o prazer em auxiliar ao cliente? Será que o Plano de Fidelidade ou milhagem é mais importante que as necessidades pessoais de cada um?

Supondo que este grande atacadista se chama MCI e muitas igrejas, contrariando ou não suas denominações, estão se tornando submissas a estes exemplos altamente disseminados, só podemos concluir que a prensa de Gutemberg chegou ao caráter cristão: líderes de igrejas e/ou células imprimem em série sua visão e modo de vida a um grupo de discípulos, seja com 12, 10, 6, etc... Pastores têm sido transformados em gerentes de produção, estrategistas de marketing ou diretores de vendas, adotando uma visão na qual o crescimento numérico é mais importante que a saúde do corpo, onde Igrejas sem identidades convergem aos ideais de uma única visão, tornando ultrapassadas palavras e conceitos que descrevem o pastor como aquele que está sempre preocupado e cuidadoso em relação às ovelhas de Cristo e aos propósitos do Reino.

Vemos muitas versões adaptadas, revistas e corrigidas do governo, grupo ou modelo dos 12, mas todas induzidas ao mesmo objetivo, a escada supracitada, a fórmula definitiva para o crescimento da igreja, na qual obrigatoriamente os nomes têm sido alterados para não pagar royalties pelo uso de expressões patenteadas. E isto já chegou aos nossos templos, nos quais líderes metodistas têm implantado um modelo de discipulado que segue estes preceitos, modificados sim, mas colhendo os mesmos resultados que igrejas de outras denominações experimentam.

Assim, não me surpreenderia se, muito em breve, algum visionário ou líder espiritual, seja ele sul-coreano, indiano, colombiano ou da próxima potência espiritual?!?! (África ou Brasil), justificados pelo argumento da batalha espiritual, resolvesse expandir a utilização de táticas de guerrilha e estratégias militares no interior da Igreja!

Relembro que nossa igreja não tem 20 ou 30 anos, não é neo-alguma-coisa, não surgiu do delírio de alguém, mas nasceu pela convicção que almas precisavam ser salvas, almas que estão aonde a igreja nunca chegará se continuar dentro dos templos, que a santidade precisa reformar a nação.

Resumidamente ela tem muita história, tem uma identidade muito bem definida. Por isto, não posso dizer que este movimento seja de todo ruim, pecaminoso, ou que não produza frutos; apenas afirmo que a Igreja Metodista não precisa dele.

A verdade é que ela possui ferramentas próprias – ainda que um pouco esquecidas por alguns – para discipular pessoas, para resgatar almas, para valorizar a individualidade e importância de cada um de seus membros, como a própria palavra de Deus nos ensina, para não somente abalar os portões, mas também saquear o inferno.

Não preciso recorrer aos documentos que acompanham nossos Cânones, nem às pastorais do Colégio Episcopal, nem mesmo a todo o material produzido pela Igreja Metodista no Brasil; preciso apenas olhar para suas raízes, sua tradição wesleyana.


Mas, independente de ser antiquado, ingênuo, saudosista ou avesso a algumas mudanças, ainda continuo, acima de tudo, dependente do amor e graça de Deus, submisso às suas misericórdias, simplesmente METODISTA. Graça e Paz, e que Deus nos abençoe.

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*Eduardo Jedliczka, membro da Igreja Metodista em Apucarana - PR - 6ª Região Eclesiástica