Voto evangélico sob a lupa de pesquisadores
Por Edelberto Behs
PORTO ALEGRE – Antes da meia-noite do domingo, 29, brasileiras e brasileiros saberão quem será o presidente da República de 2007 a 2010. O pleito, que contará com um colégio eleitoral de 126 milhões de eleitores, também vai definir os governadores de dez Estados, que terão segundo turno.
O eleitorado evangélico vai dividido para o segundo turno na escolha do inquilino do Palácio do Planalto para os próximos quatro anos, embora existam indicativos de intenção de voto mostrando que o candidato Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT), que disputa a reeleição com o candidato Geraldo Alckmin, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), fará mais votos também nesse segmento.
“Todos procuram as igrejas evangélicas, como se fossem partidos políticos”, disse a socióloga Maria das Dores Campos Machado ao Jornal do Brasil. Ela é autora do recém lançado livro “Política e religião – a participação dos evangélicos nas eleições”, no qual detecta uma competição religiosa que se estende ao campo político.
Mesmo sendo mais identificado como um candidato católico, Alckmin conquistou apoio, pelo menos no primeiro turno, de setores da Igreja Assembléia de Deus. Ainda que muitos desses segmentos sejam avessos ao ecumenismo, evangélicos, pentecostais e neopentecostais que dão apoio a Alckmin parecem pouco se importar com a vinculação do candidato à ultraconservadora organização católica Opus Dei, ou acreditam que ele não tenha vínculos com a mesma.
Em sabatina na Folha de São Paulo, já no período do segundo turno, Alckmin negou que seja do Opus Dei e declarou até não conhecê-la, embora ele tivesse apresentado a palestra de abertura do VII Máster em Jornalismo para Editores, sobre o tema “As relações entre governo e mídia”, no dia 17 de março de 2003, no Centro de Extensão Universitária, em São Paulo, promovido pelo Opus Dei.
Para o articulista Altamiro Borges, da Agência Adital, “o presidenciável Geraldo Alckmin se encaixa perfeitamente nos planos políticos e eleitorais do Opus Dei na América Latina”, organismo que “torce e trabalha na ‘surdina’” pela eleição do candidato do PSDB.
Até mesmo a governadora do Rio de Janeiro, Rosinha Matheus, e seu marido, Anthony Garotinho, que postulava uma candidatura à presidência da República pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e que se apresenta como o representante dos evangélicos, não hesitaram em aderir, já na primeira hora do segundo turno, à candidatura de Alckmin.
Um apoio que provocou mais estragos do que vantagens na campanha de Alckmin, tanto que ele chegou a admitir que deveria ter conversado, antes de pousar para fotos ao lado do ex-governador, com a candidata do Partido Popular Socialista (PPS) ao governo do Rio de Janeiro, Denise Frossard, e com o prefeito da capital, César Maia, do Partido da Frente Liberal (PFL), que romperam com o candidato do PSDB, a quem apoiaram no primeiro turno.
Essa confusão de alianças e adesões, que não observa ideologias, é promovida pelos próprios partidos políticos e candidatos. Denise Frossard disputa o governo do Rio de Janeiro com o candidato Sérgio Cabral, do PMDB, candidato de Garotinho e que tem o apoio de Lula. Cabral pede votos pra Lula, mas Garotinho apóia Alckmin, que pede votos para Denise Frossard. Como César Maia, prefeito do Rio, é inimigo político de Garotinho, ele retirou o apoio a Alckmin.
Depois da aliança de Alckmin com Garotinho, o sociólogo Ivo Lesbaupin, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, declarou, em entrevista para o Instituto Humanitas da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), que partidos como o PSDB e o PFL, inclusive o PT atual, “são capazes de qualquer coisa para chegar ao poder, manter-se no poder ou aumentar seu poder”.
Seguindo essa lógica apontada por Lesbaupin candidatos atiram-se na corrida em busca do voto de quem quer que seja, também dos evangélicos. Na análise que apresenta no livro recém lançado, Maria das Dores Campos Machado afirma que a participação individual de evangélicos na política sempre aconteceu. “A grande novidade é o fato de que agora existem atores coletivos e igrejas que participam, não só indicando candidaturas, mas participam do jogo de alianças e das campanhas políticas”, assinala.
Em entrevista ao Instituto Humanitas, Maria das Dores disse que a Igreja Católica sempre esteve na política, e que o envolvimento dos evangélicos representa o ingresso de novos atores na política brasileira. Ao mesmo tempo em que esse fato significa um avanço, porque as igrejas pentecostais constituem espaços de discussão da importância do voto, por outro lado, o voto fica circunscrito àquelas informações que recebem.
Esses atores entram na política com um nível de informação muito baixo, o que pode gerar o voto clientelista, “que não é só um voto pentecostal e neopentecostal, mas que também está relacionado com a pobreza, com a falta de informação e com o nível de instrução baixo dessas pessoas”, alertou a socióloga brasileira.
Pesquisa encomendada pelo Instituto Valores, de São Paulo, a cargo da Scenso sobre o comportamento do eleitor evangélico nas eleições de 2006, realizada na Região Metropolitana da capital paulista entre os dias 23 de agosto a 1 de setembro, ouvindo 1 mil pessoas, mostrou que apenas 6,1% dos evangélicos só vota em evangélico; 26,1% disseram que esse fator é importante, mas não decisivo, enquanto 63,8% declararam que isso não é importante.
O PT aparece como o partido que tem a maior preferência dos evangélicos paulistas, seguido do PSDB, do PMDB e do PFL. Mas apenas 3,1% dos evangélicos pesquisados eram filiados ao PT, e para 95,2% a filiação partidária dos candidatos lhes era indiferente. Os dados da pesquisa podem levar à confirmação mas, ao mesmo tempo, à constatação de que as igrejas têm pouca força para induzir o voto dos fiéis.
Mesmo que caminhem divididas, muitas vezes, em apoio a este ou aquele candidato, evangélicos, pentecostais e neopentecostais unem, contudo, suas forças no Legislativo, tanto que existe a bancada evangélica na Câmara Federal, quando o assunto em pauta está relacionado a valores, costumes e da moral, em temas da família, do casamento e da sexualidade.
“Existe um interesse em participar da elaboração das leis, da votação das leis e da normatização da vida da população brasileira”, explicou Maria das Dores na entrevista. Ela destacou, ainda, que o Congresso Nacional é responsável pela regulamentação das concessões de canais de rádio e de televisão no país, “espaços importantes para qualquer grupo que queira ampliar sua capacidade de influência na esfera pública”.
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Agencia Latinoamericana y Caribeña de Comunicación
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