Grávido de deuses
Por Dr. Luiz Alexandre Solano Rossi*
Sou cristão, mas tenho muito muitos amigos (as) que vivem outras experiências religiosas diferentes das que eu vivo: muçulmanos, budistas, afro-brasileiros, bahais, etc.
A amizade criou o respeito e com ele veio a tolerância em relação a outros mundos que pareciam diferentes e até mesmo (por absoluta falta de informação) esquisitos.
Quando resolvi sair do meu próprio mundo religioso (uma redoma que reiteradamente colocamos ao redor de nós mesmos) e me dirigir em direção a outros campos religiosos, qual não foi a minha surpresa ao contemplar o belo, a serenidade, a sabedoria, a espiritualidade e a salvação revestidas com outras roupagens diferentes daquelas que meus olhos haviam se acostumado.
Diante do novo fiz-me aprendiz novamente ao me relacionar com novos irmãos e irmãs de outras confessionalidades.
Não os via mais como inimigos ou concorrentes (ainda que o mercado de bens religiosos seja cada vez mais competitivo). E, por isso mesmo, não me vejo superior ou inferior aos que crêem de uma maneira diferente da minha.
Talvez tenhamos chegado num momento em que não precisemos mais hierarquizar os discursos como sendo verdadeiros ou falsos.
Não há discursos religiosos falsos. Existem, sim, discursos religiosos que dão sentido e significado à ordem das coisas e à própria existência. Quando hierarquizamos os discursos, principalmente os religiosos, dogmatizamos o único em detrimento da variedade. Discursos únicos são discursos absolutos. Narrativas únicas são narrativas totalizantes e totalitárias.
Quando atribuímos validade universal e cósmica a um único tipo de discurso vemos as outras pessoas e outros discursos como pessoas que pensam e vivem no erro. E, por isso, demonizamos as demais pessoas e seus discursos construindo guetos religiosos.
Minha identidade cristã se fortalece quando posso chamar meus amigos fraternalmente de irmãos (ãs). Hoje, imagino meu corpo composto de vários altares onde os mais variados deuses se reúnem numa grande celebração para me tornar mais humano.
Talvez seja essa a função dos deuses que abrigamos em nossos corpos-altares: fazer com que sejamos plenamente humanos quando respeitamos aqueles que são diferentes e, mesmo na diferença, nos assentamos para viver fraternal e solidariamente.
*Dr. Luiz Alexandre Solano Rossi: pós-doutor em História Antiga (UNICAMP) e em Teologia (Califórnia). Membro do Movimento Ecumênico de Maringá e da Comissão de Diálogo Inter-religioso de Maringá. Contato: www.luizalexandrerossi.com.br
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