20 dezembro, 2006

Onde estão os símbolos do Natal?

Nas ruas, poluição visual a serviço do comércio. Nas igrejas, o receio da idolatria. Qual é o verdadeiro lugar dos símbolos natalinos?

As velas da Coroa do Advento sinalizam os quatro domingos que antecedem o Natal.

Existe uma música infantil que diz: “Papai Noel chegou, abriu a porta e entrou... Claro, né! Não temos chaminé!” Pois é... o Brasil não tem chaminé ou neve em dezembro mas nem por isso deixa de ser influenciado pela simbologia natalina de origem européia. Ela entra pela porta! ...e, também, por nossas retinas tão fatigadas, como diria o poeta: na TV, nos shoppings e nas decorações das ruas, a profusão de imagens natalinas satura a visão e esvazia o sentido do símbolo. E muitos cristãos tendem a se afastar dessa simbologia, seja porque ela está por demais contaminada pela idéia de consumo, seja porque ela remete à idolatria e ao paganismo. Muitos se lembram, por exemplo, que a árvore era cultuada por religiões pagãs. E que o próprio 25 de dezembro era a data em que se celebrava o deus sol...


Contudo, “tão preocupante como um cristianismo idólatra é um cristianismo sem símbolos ou referências”, alerta o Rev. Edson Cortásio Sardinha, pastor da Igreja Metodista em Ji-Paraná, Rondônia. Segundo o pastor, que também é pedagogo e especialista em liturgia e arte sacra, preservar os símbolos do Natal é uma forma pedagógica de revivermos dois referenciais de nossa fé: a palavra e a tradição. “Cada símbolo natalino fala de passagens específicas dos Evangelhos de Mateus e Lucas. Sinaliza a Teologia do Verbo que se fez carne, como demonstra João em seu Evangelho. A igreja que não comemora o Natal está jogando fora a valorização do próprio Evangelho da infância do Senhor”, afirma ele.

O papel do símbolo
O Rev. Edson explica que o símbolo faz parte do cotidiano e significa parte de algo maior. “Como um galho cortado faz parte de um galho maior, assim é a origem etimológica da palavra símbolo. O símbolo no sacramento é sinal visível de uma graça invisível”.
Segundo o pastor, não conseguimos viver sem a comunicação dos símbolos. Sejam visuais, sonoros ou táteis, eles estão em todo lugar: nas placas, semáforos, na arte, na educação. “O Novo Testamento é rico em símbolos: pão, vinho, pomba, óleo, canto, etc. Ignorá-los é se perder num mundo irreal, platônico, totalmente fora de relevância para a mente humana. O nosso conhecimento é construído a partir de símbolos que existem e que criamos. Cristianismo sem símbolo cristão é cristianismo sem parte de sua identidade”. No extremo oposto, está a idolatria, que é a escravização ao símbolo. “O símbolo na idolatria perde todo seu contexto pedagógico e se transforma em amuleto muito utilizado pelas religiões animistas. Contudo, isso não pode ser argumento para ignorarmos as riquezas dos símbolos cristãos e descaracterizar a nossa fé cristã”, explica o pastor.

Árvore de Natal na fogueira
O Rev Edson Cortásio conta que chegou a ver igreja metodista acendendo fogueira para queimar árvore de natal, guirlandas, sinos, presépios, cartões, etc. “Como a nossa cultura protestante é anti-romanista, todos os símbolos cristãos usados pela liturgia católica são considerados abomináveis”, explica ele. “Com isso percebemos nas igrejas evangélicas, inclusive em muitas igrejas metodistas, uma supervalorização dos símbolos judaicos e uma descaracterização do templo com relação aos símbolos cristãos. Substituem a cruz pelo castiçal judaico (menorá), retiram as velas do advento e colocam o shofar, a bandeira de Israel, etc. Este é um movimento estranho e que descaracteriza o cristianismo. Não sou contra os símbolos judaicos. Eles são importantes na liturgia judaica e podem ser usados na liturgia cristã. Mas sou contra a descaracterização de nossas igrejas”.

O resgate do significado
Segundo o Rev. Cortásio, o resgate dos símbolos do Natal deverá vir pelo resgate da liturgia. “Quando valorizarmos os mistérios litúrgicos enquanto mistérios divinos, valorizamos os símbolos como parte desse mistério”. Diante dos apelos comerciais, ele recomenda não antecipar a comemoração do Natal. “Não podemos, a pedido do comércio, alterar o calendário litúrgico. Devemos esperar. Preparar o coração e viver cada parte do Advento. Sem pressa. Sem correria. Devemos, diante da árvore, símbolo da luz de Cristo e diante do presépio e das canções natalinas, viver o mistério. Essa é a beleza da liturgia. Através da liturgia podemos voltar a Nazaré e contemplar o anjo conversando com Maria. Podemos acompanhá-la até sua visita a Isabel. Podemos ir a Belém, e ver Jesus na manjedoura. Podemos cantar com os anjos e se alegrar com os pastores. Podemos novamente voltar ao Oriente e iniciar uma caminhada atrás da estrela de Belém”. Para o pastor, a liturgia também pode ser um momento profético de denúncia e revelação da desigualdade social, ao trazer à memória o Cristo sem lugar para nascer, d morte dos inocentes pelo terrível Herodes, a fuga para o Egito, a perseguição e a exclusão social. “Que junto ao nascimento de Cristo, a liturgia de nossas igrejas nos auxilie a encontrar paz para celebrar a alegria e força para combater as injustiças”. Amém!

De origem latina, a palavra presépio significa manjedoura ou estábulo. Hoje significa a encenação do nascimento de Jesus. Segundo alguns estudos, o primeiro a encenar o nascimento de Jesus foi Francisco de Assis, no século XIII. Na foto, um presépio artesanal da organização não governamental de comércio solidário Ética Brasil (www.eticabrasil.com.br).

O primeiro cartão de Natal “comercial” surgiu na Inglaterra em 1843. O pintor John Calcott Horsley desenhou uma família ao redor de uma mesa bastante farta e, ao lado, um rico alimentando crianças pobres (provavelmente inspirado no “Conto de Natal” de Charles Dickens, escrito naquele mesmo ano). Ele trazia a frase que se tornaria clássica: “Feliz Natal e Próspero Ano Novo”. Horsley fez o cartão sob encomenda de Henry Cole, diretor de um museu, que imprimiu mil cópias.

A criação da árvore de Natal é atribuída ao alemão Martinho Lutero, líder da Reforma Protestante. Conta-se que Lutero voltava para casa, num gélido dia de dezembro, quando se encantou com a paisagem dos pinheiros elevando-se em direção ao céu estrelado. Parecia que as árvores estavam ornamentadas pela luz das estrelas. Ao chegar em casa, quis compartilhar a cena com sua esposa e filhos: plantou um galho de pinheiro num vaso e decorou-o com pequenas velas acesas; a partir de então, um símbolo da Jesus, luz do mundo.


A própria data em que se comemora o Natal tem um significado simbólico: 25 de dezembro era o dia em que se celebrava o deus sol. Escolher essa data para comemorar o nascimento de Jesus foi uma estratégia missionária: o objetivo era anunciar Jesus – nosso “sol da justiça” aos povos pagãos.

Papai Noel: o que é que a gente faz com ele?
Muitos pais e mães cristãos ficam desconcertados quando seus filhos pedem para “escrever uma cartinha para o Papai Noel”. Muita calma nesta hora! É natural que as crianças sejam influenciadas pelos símbolos presentes na TV, no comércio e até nas escolas. O Rev. Edson Cortásio lembra que o Papai Noel não é um símbolo anticristão por natureza. “Ele faz parte dos contos de fadas tão comuns em nossa infância. Está no grupo da Branca de Neve, Cinderela, etc.” Ele destaca, porém, que essa figura causa exclusão social e constrói uma imagem de Natal sem presépio – muitas crianças conhecem a figura do Papai Noel e não conhecem a história do verdadeiro Natal.

“Como pastor e pedagogo, opto em trabalhar o Papai Noel como é apresentado pelo comércio. Ou seja, é apenas mais um boneco nas lojas. É um homem com fantasias que distribui balas para as crianças que passam pelas ruas e um personagem dos desenhos animados presente no imaginário infantil”, diz ele. Assim, não é necessário “combater” a figura do Papai Noel mas, por outro lado, é necessário valorizar a tradição cristã. “Devíamos trabalhar mais os Evangelhos da infância de Jesus, o presépio e os símbolos litúrgicos do Natal. Com um Natal celebrado e vivido na liturgia, a ênfase sobre o Papai Noel perde forças”, afirma.

Suzel Tunes

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