24 agosto, 2011

Mosaico (Pr. Nilson da Silva Junior)

Foi lançado há poucos dias o livro “Cristianismos – Questões e Debates Metodológicos” de autoria de André Leonardo Chevitarese. O autor é historiador, professor doutor do núcleo de história da Universidade Federal do Rio de Janeiro e consultor das revistas Superinteressante e Galileu. Em entrevista ao “Programa do Jô”, da Rede Globo (19/07), comentou que o livro apresenta alguns resultados da pesquisa histórica relacionada à religião e à vida de Jesus. Segundo o autor, os trabalhos demonstram que nenhuma denominação religiosa pode utilizar o cristianismo como motivo para intolerâncias e o ponto central do texto está na questão de que toda percepção religiosa deve ser entendida no plural, por isso, o título utiliza a palavra Cristianismos e não Cristianismo. Chevitarese afirmou que se esse entendimento for aplicado, as relações entre indivíduos podem se tornar bem melhores.

A provocação desta obra é interessantíssima e pertinente, afinal, um dos fatores mais prejudiciais à boa convivência religiosa sempre esteve no entorno de tentar ignorar a existência da pluralidade. Sejam nos pensamentos ou nas tradições, na interpretação ou na contextualização, a religião é um oceano vastíssimo, formado por experiências e conclusões individuais, que quase nunca se repetem da mesma forma, por mais que se tente.

Por isso, tratar Cristianismo como Cristianismos, talvez seja a melhor maneira de entender e aceitar a característica facetada desta religião, que é diversa nos vários países, nas várias culturas e nas muitas denominações. E talvez, uma ação ainda mais contundente seria usar esta percepção para outras áreas da vida, redimensionando questões do cotidiano com a mesma lógica. Por exemplo, poderíamos conceber a existência de ideias, ao invés de ideia, conclusões, ao invés de conclusão, e substituíssemos outras palavras… pensamento, por pensamentos, visão, por visões, ação por ações.

Esta é uma lição infinita que poderia transcender não somente a religião, mas também os costumes, a maneira de interpretar, de falar, de agir. Além do mais, admitir a pluralidade é caminhar em direção ao respeito, a tolerância, a participação, à comunhão. Não há como o mundo ser mundo sem a variedade das cores, formas, raças, opiniões. Ele só será bom e bonito se nos entendermos como um grande mosaico, capaz de formar beleza a partir da individualidade existente em cada um de nós.

Ao olharmos para o relacionamento de Jesus com seus discípulos, nos deparamos com um verdadeiro mosaico. O evangelho de Lucas demonstra que o Mestre escolheu doze homens, “aos quais deu também o nome de apóstolos: Simão, a quem acrescentou o nome de Pedro, e André, seu irmão; Tiago e João; Filipe e Bartolomeu; Mateus e Tomé; Tiago, filho de Alfeu, e Simão, chamado Zelote; Judas, filho de Tiago, e Judas Iscariotes, que se tornou traidor” (Mateus 6.13-16). Dentre estes, existiam ex-pescadores, um ex-cobrador de impostos, além de outros personagens comuns do povo e, até mesmo um traidor, como destaca o texto. Essa variedade de indivíduos, com histórias, experiências e personalidades diversas, é que compôs o primeiro mosaico cristão da humanidade, que, com seus defeitos e qualidades, nos desafia até hoje na luta da convivência e da religião.

Quem sabe possamos aceitar a indicação do historiador para considerar a pluralidade como parte integrante de nossas vidas. Quem sabe tenhamos a capacidade de imaginar algo maior do que a nossa individualidade e sermos mais receptivos em nossas relações, tolerantes em nossas posições e compreensivos em nossas diferenças.

Rev. Nilson