12 setembro, 2006

O Espírito Santo e a Unidade Cristã: um testemunho de esperança

Por: Claudio de Oliveira Ribeiro

"Que sejamos um para que o mundo creia" (Evangelho de São João)

[Depoimento solicitado pela Diocese Católica de Duque de Caxias
e São João do Meriti (RJ) para ser publicado no jornal Pilar].

Quando eu era criança, vi em minha Igreja Metodista na cidade de Volta Redonda a presença de um bispo católico, d. Valdir Calheiros. Aquela visita despertou a minha atenção, pois não era um fato comum.... evangélicos e católicos juntos. Depois, soube que ele estava ali em conversa com o pastor e membros da comunidade para encontrar caminhos de apoio a uma família de nossa igreja que havia perdido o filho, vítima da repressão militar daquela época. Foi a semente para que eu mais tarde pudesse entender que ecumenismo não é um conceito, uma idéia abstrata, uma discussão teórica. O ecumenismo está baseado no amor concreto dirigido às pessoas.
Cresci naquela cidade respirando o ar de renovação que o Espírito Santo estava possibilitando para a Igreja Católica, desde o final dos anos de 1960. Como adolescente metodista e depois jovem, fui descobrindo também as coisas boas da minha igreja, assim como os limites dela, e percebi, muito concretamente, que a unidade cristã não é uma opção. Ela é base do Evangelho!
Muito jovem, já no seminário preparando-me para o pastorado, conheci outros grupos católicos, li livros e reflexões de pessoas como Leonardo e Clodovis Boff, D Paulo Evaristo Arns e teólogas como Tereza Cavalcanti, Ana Maria Tepedino. Trabalhamos em iniciativas comuns cujo alvo era a paz, a justiça e a comunicação mais nítida do amor de Deus, em comunhão e solidariedade.
Aos 21 anos fui chamado por um pastor metodista amigo, de um coração enorme e de um firme compromisso ecumênico [aliás, isso é uma repetição, pois coração e união são lados inseparáveis de uma mesma moeda], para fazer parte da equipe de pastores metodistas da Baixada Fluminense. Era o pastor Melchias Silva e ele me apresentou muitas pessoas, de quem guardo a lembrança de um testemunho bíblico significativo e mostrou-me um caminho sobremodo elevado de pastorado, que se faz na vida concreta, na solidariedade e na justiça. Lembro-me, com carinho da Mariazinha e do padre Domingos nos primeiros passos da Pastoral Ecumênica da Terra, em Xerém, Duque de Caxias, e, entre os metodistas, o seu Catita, a Mônica e tantos outros. [Posteriormente, o padre Domingos, por ocasião da Campanha Ecumênica da Fraternidade, em 2000, trouxe uma impactante pregação da Palavra de Deus em nossa comunidade metodista Filadélfia, no bairro Dr. Laureano].
E foi assim: manhã escaldante do dia 10 de janeiro de 1984. Rodoviária "do Shopping" (assim falávamos), com filas intermináveis de jovens indo para a praia no Rio. E lá estava eu: terno e gravata, rumo à Parque Araruama, São João do Meriti, minha primeira nomeação como pastor! Na primeira semana de trabalho, procurei colocar em prática aquilo que Deus havia me mostrado desde garoto: que o Espírito Santo não tem barreiras de igrejas ou de religião, que os desafios pastorais são muitos e que somente podem ser enfrentados ecumenicamente. Na comunidade do Sagrado Coração de Jesus, encontrei o padre Marcos, belga, preocupado com a saúde do povo e com a pastoral operária. Ele abriu a porta e me estendeu a mão, como se apraz aos cristãos. Juntos, participamos de esforços concretos de justiça: campanhas contra a dengue, manifestações, reuniões da ABM (Associação de Bairros de Meriti), cursos populares, etc... Católicos e evangélicos juntos: Noêmia (da Metodista), Ester, a irmã e o pai dela, padre Adelar, frei Atílio, hoje no Estado do Espírito Santo, Sérgio Bonnato e muitas outras pessoas cujo testemunho fica na memória. Dois anos depois, tive o prazer de ter o padre Marcos participando como celebrante de meu casamento com Magali.
E dessa forma fui "aprendendo e ensinando uma nova lição": que o amor de Deus nos une, que a fé sem obras é morta e que se não amarmos a quem vemos do nosso lado não poderemos amar a Deus que não vemos. A nossa igreja organizou o Baixada Livre que era um movimento pastoral que procurava colocar a fé em ação, a Bíblia na vida, afirmar que a igreja é de todos, que as mulheres e as crianças têm destaque e que os pobres podem se sentir felizes porque deles é o reino de Deus. Entre os metodistas daquela época guardo com carinho a companhia das pastoras Rosângela (da pastoral da mulher, que impetrou a bênção em uma das grandes celebrações do Sétimo Intereclesial, em 89), Elena, Nancy, Joana D’ Arc (dos cursos bíblicos de Petrópolis) e Maria (da Comissão Pastoral da Terra) e dos pastores Jorge Luiz, Nelson, Jorge Militino, Ênio, Léo, Dermival, Oséias entre outros, e uma lista de dezenas de leigos e de leigas – como a Belgita (do PAS-Baixada), a Andréia (do Conselho Comunitário de Saúde), o Reinaldo César, a Francisca e o José Alves, a Laura, a Fezinha, a Zípora, a Sirley e sua família, o Daniel Evangelista e outros –, que desejavam ver a fé se tornar robusta ao ser alimentada na comunhão. Nas atividades do Baixada Livre contávamos sempre com o Frei Davi e com os sonhos dele, muitos hoje tornados realidade, com a Luciene e o trabalho popular com as mulheres, com o pessoal do MUB (Movimento de União dos Bairros), com o testemunho do Zumba, do Miguel e da Edna Maia, na luta política, e uma lista interminável de contribuições.
E veio a organização do Sétimo Encontro Intereclesial de Comunidades de Base... Aí foi demais! Como eu aprendi com o Névio, com a irmã Delir, com o Celso e a Leu (alías, ajudei a celebrar o casamento deles), com a irmã Luzia, com o Tião, com a Edna, com a Elza (que depois trabalhou no ISER), com o Geraldo e a Neidiana, com a Sílvia (hoje em Costa Rica), com a d. Zenaide, com a Lea, do ensino religioso, com a Rosa, com o Pedro (de Xerém, que vi chorar de emoção lá em Ilhéus, no Décimo Intereclesial, quando cantamos juntos o "Trem das Cebs", composição dele), com D. Mauro Morelli, que eu tive também como bispo para mim, não obstante ter os meus: bispos Paulo Ayres e Paulo Lockmann. A unidade cristã se faz no cotidiano, nas situações concretas de serviço e de amor ao próximo e também é sinalizada em experiências como a do Sétimo Intereclesial, quando católicos abriram suas casas para acolher evangélicos e vice-versa, quando partilharam o alimento, a fé, a mesa, o mesmo abraço, o mesmo ideal: vida abundante para todos (João 10.10). É impossível não nos perguntarmos: por que há grupos que ainda são contra o ecumenismo?
Por onde passei, aprendi muito do Evangelho com os irmãos e as irmãs das comunidades católicas. Espero ter partilhado também algo de bom. No Gramacho, recordo-me com prazer de ouvir a pregação da Palavra feita em nossa igreja pelo Roberto Ayres, no dia da Reforma Protestante; e também do sr. Antônio, do sr. Eduardo, esposo da Arlete, que era de nossa igreja, do padre Paulo. Creio que o Espírito Santo preparou tudo isso e essa memória florescerá nesse novo século, como a mesma força das águas que cobrem o mar. Na Igreja Metodista Filadéfia (Dr. Laureano), já no final da minha estada aí, após 18 anos, tive a satisfação de fotografar o padre Marcos Santana, junto com o pastor Levi Bastos, nossos amigos, celebrando o batismo do Guilherme, meu filhinho, que hoje está com 5 anos. Em casa, sempre mostramos a foto para ele e procuramos ensinar que o amor de Deus é maior que as barreiras humanas, que a divisão das igrejas não é da vontade Dele e que o mundo só terá paz se a humanidade se unir em comunhão. Mostro nas fotos a Edna, do CEBI, e conto para ele que, nesse dia, ela cantou uma linda canção para os metodistas que lá estavam anunciando e pedindo que o Espírito Santo viesse nos iluminar. Sempre trabalhei alimentado por esse espírito: o da paz, da comunhão e da solidariedade. Agradeço a Deus pelas comunidades da Diocese de Duque de Caxias e São João do Meriti, pelo pastor D. José Francisco, bispo dessa igreja, e confio que a experiência ecumênica vai aumentar e se fortalecer, como aprendi com o irmão Jether Ramalho, da Igreja Congregacional, ainda que haja sinais em contrário. Pelo menos, sonhemos que as crianças como o Gui possam colher no futuro os frutos da comunhão.
Hoje, com 44 anos de idade, lecionando teologia e trabalhando como pastor em terras paulistas, continuo o mesmo. Mudam os nomes dos irmãos e das irmãs católicas com as quais convivemos aqui, são outras as experiências e desafios missionários, mas não muda o sentido maior da fé e do Evangelho. Muitos amigos/as têm nos perguntado sobre a decisão da Igreja Metodista, em sua assembléia nacional em julho passado, de se retirar dos órgãos ecumênicos nos quais a Igreja Católica Romana também integra oficialmente, como o Conselho Nacional de Igrejas (Conic), por exemplo. É difícil acreditar que tenha sido algo do Espírito Santo. Difícil também não pensar – e há sinais evidentes disso – de que se trata mais de uma política de grupos para ter o seu poder interno reforçado. Todas as igrejas, católica e evangélicas, passam por isso, não é verdade? Não foi, a meu ver, uma decisão corajosa, pois somente o diálogo faz acabar o medo. Senti tristeza, confesso. Acatamos a decisão, mas, humildemente, acho que eles "não sabem o que fazem", como no final do Evangelho. "É importante destacar que a decisão não impede a participação de metodistas em celebrações e atos ecumênicos e cursos ministrados por entidades de caráter ecumênico. Pastores e pastoras presentes no Concílio e que participam do movimento ecumênico deixaram claro que, embora tenham que desligar oficialmente da diretoria de algumas organizações, não deixarão de participar de atos públicos, celebrações e projetos sociais em favor da vida" (cf. jornal Avante, agosto 2006, Igreja Metodista do Rio de Janeiro, p.6). [maiores informações na internet http://www.metodistaecumenico.blogspot.com]. O resultado é que, em meio ao descontentamento com a decisão, várias pessoas e grupos, em diferentes partes do Brasil e do mundo, têm se sentido vocacionadas pelo Espírito para reavivar a prática ecumênica. O ecumenismo ao invés de diminuir em nosso meio, poderá aumentar e se fortalecer. Espero que também seja assim no meio de vocês.

Claudio de Oliveira Ribeiro
pastor metodista

1 Comments:

At julho 19, 2008, Anonymous Anônimo said...

Como encheram meu coraçaõ de alegria suas palavras , sou católico e tenho um desejo de ver a unidade dos cristãos em evidência!! Creio que se consiguirmos nos amar mais, de forma que o mundo possa ver este amor, o mundo será alcançado !! Pois se somos de Deus, e Deus é amor, importa que nos amemos , não é? também tenho um blog e vou adiciona-lo aos meus links um forte abraço e fike na Paz

 

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