18 setembro, 2006

Sangue semeado no campo

O campo brasileiro quase sempre tem sido noticia na mídia nacional e internacional, não porque tenha produzido uma safra Record, ou porque finalmente a reforma agrária tenha sido concluída. Mas sim pela violência causada no conflito de dois lados: o lado dos que querem possuir a terra, alegando precisar dela para tirar o seu sustento e viverem com um pouco mais de dignidade. E do outro lado na linha de defesa, aqueles que são proprietários e se justificam alegando defenderem o seu direito sobre a propriedade adquirida por compra ou por herança. Muitos talvez não se lembrem mais, de Chico Mendes, El Dourado dos Carajás, e tantos outros conflitos no campo, que no lugar da semente, recebe muitas vezes no seu leito sangue e corpos semeados perfurados pelas balas dos PMs e jagunços contratados, ou crânios amassados pelos cacetetes da policia. O episódio mais recente, que talvez ainda esteja fresco na memória de alguns brasileiros, (digo talvez porque a mídia se ocupou de outros escândalos “mensalonicos”, no cenário político nacional e nada mais falou do assunto) foi o assassinato da missionária e irmã religiosa Dorothi Stang, no dia 12 de fevereiro em Anapu, Pará. Em momentos como esse à questão da terra ganha a atenção dos governantes e da nação, com repercussões até internacionais. Mas logo que o corpo é sepultado na terra, (ou deveria dizer plantado na terra?) tudo cai no esquecimento.

Milhares de pessoas, nessa terra onde tudo que se planta dá, morrem todos os dias, no campo ou na cidade sem chamarem a atenção da mídia. São trabalhadores anônimos comuns, que morrem dos mais diversos males, alguns naturais, ou fruto da violência urbana e rural, outros provocados pela ganância dos poderosos atrelados aos políticos. E o que é pior, com a conivência e a omissão da parte de muitos cristãos, que se calam ou se vendem no exercício do ministério profético.

Movido pela indignação, e tomado pelo Espírito que do alto me anima.
Minha fé levou-me a escrever um protesto em forma de rima.
Refletindo sobre as milhares de mortes que todos os dias ocorre.
Resolvi escrever como, quem e por que no Brasil se morre.

Morrem de diversas formas é precocemente, muitos ainda no ventre.
Morrem sem assistência ou prece, nas portas dos hospitais, ou filas do INSS.

Morrem ouvindo os “crentes” dizerem que é à vontade de Deus e só resta aceitar, que quando seu Reino chegar, e Jesus voltar então tudo vai melhorar, até lá só nos resta orar.

Morrem muitas vezes tomados de desgosto e desespero. Impotentes vendo seus filhos morrerem primeiro. Vitimas da seca, da fome, da subnutrição. Com as mãos estendidas pedindo uma migalha de farinha ou pão.

Morrem porque o suco de limão sem açúcar na mamadeira não possui as mesmas vitaminas do leite materno.

Morrem porque a mãe não se alimenta e sem alimento não se produz leite, e do seu peito a cada sugada só o sangue anêmico escorre. E com o filho morto grudado nele em seguida ela também morre.

Morrem porque as vaquinhas de onde vinha o leite, na morte já os precederão. Ou estão tão debilitadas, por falta do pasto que secou, e a palma xiquexique agora comida de gente virou, e para o gado não mais sobrou.

Morrem porque os homens da televisão não vieram mais não, por que infelizmente nem todo domingo é legal e tam pouco da gente. Mas fazer o que? Paciência, infelizmente fome é miséria são espetáculos que rendem audiência.

Morrem porque a morosidade do governo, e as clausulas da Fome, Miséria, Indigência, impedem investimento no campo, e uma vida melhor ali. Não é mera coincidência se as siglas formam F.M.I.

Morrem porque os governantes estão preocupados com outras questões. E muitos se corromperam a preço de “mensalões”.

Morrem porque a industria da seca precisa se manter, como trampolim que da acesso e mantém muitos no poder.

Morrem porque aquela verba a eles destinada tomou outro rumo

Morrem porque o governo deu a terra, mas não o insumo.

Morrem de posse de uma fé alienante e cara, sem ter saciado sua sede na fonte da Livre Graça, substituídas por valores levados em malas.

Morrem sem sonhos, sem esperança e às vezes sem registro e nem mesmo nome.

Morrem porque se zerou a vida e a esperança antes da fome.

Morrem de fome e sede, em cima de uma terra produtiva que se tendo investimento e boa vontade, e ela perfurando do seu seio a água jorrara.

Morrem como pessoas anônimas e fortes que não admitem matar, e são plantados na terra, como sementes que morrem pra ressuscitar. Morrem deixando na mente de quem refletindo sobre a morte repensa a vida, duas perguntas que não querem e não pode calar: Até quando mortes dessa forma vão continuar? E Igreja Cristã brasileira onde você esta?

Estive com fome e me deste...
Estive com sede e me
deste...
Estive nu e me...

Pr. José do Carmo da Siva
Igreja Metodista em Fátima do Sul-MS.
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