Mateus Ricci e João Adão Schall von Bell - jesuitas que por volta de 1583 promoveram a inculturação da fé cristã na China e sofreram com o dogmatismo
(texto extraído do capítulo 6 do livro "Começando de Jerusalém", escrito por John Foster e publicado em português em 1961 pela Imprensa Metodista que narra de forma suscinta e intrigante o avanço missionário e a expansão cristã através de dezessete séculos, começando justamente de Jerusalém).
Em 1583, Mateus Ricci, jesuíta italiano, não apenas penetrou no sul da China, mas dentro de vinte anos estava residindo em Pequim, a capital, e estava começando a influenciar os círculos da corte.
Havia se tornado chinês no vestuário, maneiras e falar, e havia conquistado amigos entre os oficiais por sua vasta cultura, tão diferente de toda a educação literária deles. À sua casa podiam ir para examinar e discutir seus relógios e lentes; instrumentos e livros matemáticos, astronômicos e geográficos; música quadros e pinturas; livros e Bíblias em encadernações magníficas.
Ricci era bastante erudito em literatura chinesa, respeitava bastante os costumes chineses, e muitas vezes usava termos dos clássicos chineses (Shang-ti, Ser Supremo e T'ien, Céus), quando falava de Deus. Dizia que as cerimônias que demonstravam reverência para com Confúcio, e para com os antepassados de uma pessoa, não precisavam ser consideradas como culto, e desse modo não colidiria inevitavelmente com a Fé crista. Conta-se que ao morrer, em 1610, havia 2.500 cristãos. Entre estes se incluía um dos mais altos oficiais, sete membros de uma família intimamente relacionada com o imperador, e seis senhoras da corte. Conversões como essas aumentaram. Em 1648, quando os manchus estavam invadindo a China pelo norte, o herdeiro do trono, a imperatriz e duas imperatrizes dowagers foram batizados, recebendo o Príncipe o nome de batismo de Constantino. Realmente iria repetir-se aqui a história do império romano?
Os manchus triunfaram, mas as esperanças dos jesuítas ainda eram muito grandes. Pois o Padre João Adão Schall von Bell (1591-1666), alemão, foi nomeado oficial astrônomo, e exercia grande influência junto do novo imperador manchu.
Schall escrevia:
“Como antigamente uma estrela trouxe os Magos à adoração do verdadeiro Deus, assim o Príncipe do Extremo Oriente, pelo conhecimento das estrelas, pode ser levado a reconhecer e a adorar o Senhor.”
Aqui estava ainda uma outra esperança não realizada. O novo imperador foi o maior de todos os manchus, K'ang-hsi. Foi um estudante sério das ciências européias, e durante cinco meses estudou diariamente com o Padre Verbiest. Embora nunca persuadido a tornar-se cristão, foi ele que levou a missão a conseguir o seu maior sucesso, publicando um decreto em 1692, garantindo liberdade do culto cristão por todo o império. O conhecimento de que os jesuítas gozavam de prestígio na corte impediu por muito tempo que os oficiais locais interferissem, e por esse tempo afirmava-se haver 300.000 cristãos que se encontravam em todas as províncias menos no extremo ocidente. Além dos jesuítas, dominicanos e franciscanos e alguns outros tinham vindo para valer-se da oportunidade.
Houve, porém, uma séria divisão entre os missionários, especialmente dos dominicanos contra os jesuítas, quanto ao problema de até onde o cristianismo podia acomodar-se ao costume chinês.
A famosa controvérsia dos Ritos (inevitável a comparação com o que aconteceu em Madura, na índia) foi encaminhada para Roma, discutida entre os eruditos da Europa, e não terminou durante um século (1634-1742). Em seu âmago havia estes dois problemas:
1) Poderiam os cristãos usar para "Deus" Shang-ti e T'ien dos clássicos confucianos, ou devem ser limitados a um único termo T'ien cha (Senhor dos Céus)?
2) Poderiam os cristãos ligar-se a outros oficiais em cerimônias, honrando Confúcio como um legislador, sem adorá-lo; e, semelhantemente, poderia um cristão unir-se a outros membros de sua família em reverência aos seus antepassados, sem adorá-los?
O imperador K'ang-hsi estava bastante interessado em dar a sua opinião — em apoio da permissão de Ricci de há muito estabelecida em ambos respeitos. Quando foi anunciada a decisão do papa em 1704, verificou-se que era proibição.
Uma cópia chinesa da decisão do papa ainda subsiste, apresentando notas furiosas a tinta vermelha, pela mão do imperador:
“Isto demonstra como os ocidentais de mentalidade estreita falam a respeito da alta doutrina da China — entretanto nenhum deles tem educação chinesa!... O autor disto é como qualquer outro sacerdote budista ou taoísta, mas nenhum jamais foi tão longe quanto ele. Doravante não se permitirá a nenhum ocidental propagar a sua religião na China. Assim evitaremos muitos aborrecimentos.”
A ameaça de K'ang-hsi não foi cumprida literalmente. A Missão de Pequim, ligada à corte por serviços astronômicos e outros, permaneceu sem ser molestada até 1805, mas em outras partes, desde 1707 por mais de um século e um quarto (125 anos) houve surtos de perseguição, com prisões, exílios e execuções.
Todavia, nunca faltaram recrutas missionários, embora chegassem em números menores, algumas vezes através de rotas indiretas, e muitas vezes com risco de suas vidas.
Em 1810 informou-se que trinta e um sacerdotes europeus e oitenta chineses estavam trabalhando no império. Embora uma parte de sua obra tivesse sido destruída, a religião cristã não devia desaparecer nessa ocasião.
Quando, em meados do século 19, começou a raiar novamente a alvorada da oportunidade, haveria uma Igreja de cerca de um quarto de um milhão (250.000) para saudar o novo dia.
----------------------------------------------------------
Este livro pode ser lido integralmente no site da Igreja Metodista de Vila Isabel.
0 Comments:
Postar um comentário
<< Home