11 julho, 2009

É necessário redescobrir a alegria de ser pastor de comunidade local e rever esse frisson pelo episcopado (Ronan Boechat de Amorim)

Eu sinto uma grande alegria, um grande privilégio e consequentemente uma grande responsabilidade em ser pastor de uma comunidade local.
Meu chamamento por Deus, meu preparo teológico no velho Seminário César Dacorso Filho, meus votos de presbítero da Igreja foram para que eu pudesse ser pastor.

Eu digo isso porque aparentemente desaprendemos a alegria, o grande privilégio e a conseqüente responsabilidade em sermos pastores e pastoras de uma comunidade local. O frisson é ser bispo ou bispa.
As conversas nos encontros de pastores giram em torno de “Você é candidato a bispo?” ou “Você já tem um candidato a bispo?”. Não raramente alguns disparam: “você está fazendo isso para se promover, porque quer ser bispo, não é?”. Ser pastor ou pastora parece-me, tornou-se apenas uma etapa necessária para se chegar ao episcopado da Igreja.

É verdade que a Palavra afirma que boa coisa aspira quem quer ser bispo. Não há pecado em desejar ser reconhecido pela Igreja como um bom pastor que pode exercer a função de bispo ou bispa. O problema não é o desejo em si, mas a “cultura” predominante em que isso se tornou na vida da igreja.

Ser bispo é moda, é um valor cultural. Cabe nos perguntar: “por que?”. Ainda não fiz essas perguntas para os meus amigos pastores e pastoras, mas imagino que eles dirão: “é para servir melhor ao Senhor nosso Deus!” ou “Como Bispo ou bispa vou poder implementar um projeto renovador para a igreja”. E é possível que respostas como essas sejam sinceras e verdadeiras. Mas a igreja local, pastoreando o povo de Deus, é ao meu ver o lugar por excelência para servir ao Senhor e para implementar um projeto renovador para a Igreja. O pastoreio de pessoas e não a administração da instituição é o terreno fértil para o melhor e mais leal serviço a Deus e para início de movimentos de santidade, de evangelização e despertamento missionário.

Já tive a ilusão que a mera ocupação de cargos e funções de poder, ou ao menos de algum poder, promovem mudanças. Já participei do Conselho Diretor do Bennett, do antigo Conselho Regional, da Coordenação Regional de Ação Missionária (COREAM), já fui o líder clérigo da delegação da I Região ao Concílio Nacional... e não se muda a igreja com leis, programas, projetos... Há propostas minhas de todo tipo em vários livros de atas, algumas que nunca saíram do papel... aprendi que as mudanças verdadeiras não nascem de “canetada” (decisão institucional), mas da oração e do pastoreio segundo o coração de Deus.

Há ainda presente essa ilusão: “quando eu chegar no poder vou fazer e acontecer!”. Desconfio que esse desejo em ser bispo ou bispa nasça dessa visão de mudar a igreja através da ocupação de postos chaves de poder. Mas há também outras desconfianças: servir-se e beneficiar-se do poder para promover a si mesmo ou um grupo. O Bispo tem poder sobre todos os pastores de sua região, pode viajar pra um lado e outro às custas da Igreja ou daqueles que o convidam. O Episcopado para muitos é o “ápice” de uma carreira pastoral, sinal de prestígio, de poder, de oportunidades.

Sinceramente devemos inverter essa ordem de prioridades, ou essa visão. O “ápice” na vida de um homem ou mulher chamados para o pastoreio deve ser o “apascentar o rebanho do Senhor”, e jamais dirigir uma instituição, ainda que haja as melhores intenções e propósitos. O “ápice” na vida de um homem ou mulher chamados para o pastoreio deve ser o pastoreio em si, ser colocado como ministro(a) de Deus sobre a vida de pessoas e ajudá-las a ver, experimentar, alimentar-se, desenvolverem-se, amadurecerem-se, serem remidas pelo sangue do Cordeiro derramado lá na Cruz, serem transformadas pela ação maravilhosa do Espírito Santo, serem curadas de seus pecados e de sua desumanidade, serem discipuladas para serem discípulas que fazem novos discípulos que fazem novos discípulos... terem seus nomes escritos no livro da vida.

O “ápice” na vida de um homem ou mulher chamados para o pastoreio deve ser presenciar os milagres de Deus que transformam pecadores em santos, perdidos em salvos, racistas e egoístas em irmãos, solitários em solidários... deve ser participar dos milagres de Deus na vida das pessoas e da comunidade, quando uma pessoa deixa de beber para a honra e glória de Deus, deixa de bater na esposa ou no esposo, deixa a prostituição ou o adultério, deixa a vida de violência e corrupção.

É maravilhoso demais participar do novo nascimento, da conversão e da nova vida dessas pessoas a quem o amor de Deus vai alcançando, vivificando, santificando, humanizando.

Precisamos redescobrir as alegrias, o grande privilégio e responsabilidade de estarmos na “infantaria” do “exército” de Deus; aqueles que estão na ponta, à frente, desguarnecidos de seus confortáveis escritórios e fortalezas, mas caminhando na dependência de Deus, sob as mãos daquele que nos refigera a alma e nos guia em direção aos pastos verdejantes. E assim, combatendo dia a dia o poder do mal que veio para matar, roubar e destruir, até que Deus o lance para sempre no poço de enxofre cujo fogo não se apaga nunca. Aleluia! Maranata, Senhor Jesus!

Precisamos redescobrir as alegrias, o grande privilégio e responsabilidade de sermos os que ouvem e falam em nome de Deus, os que no poder de Deus exortam e consolam o povo de Deus, os que se alegram com os que estão alegres e choram com os que estão tristes. Precisamos ser os que em nome de Deus profetizam palavras para encorajar e levantar os caídos, fortalecer os que têm as pernas bambas e as mãos destreinadas para a luta pelo Reino de Deus. Aqueles que acolhem e aconselham os que andam sem norte e sem discernimento. Precisamos ser aqueles a quem Deus coloca como líderes espirituais sobre seu povo.

Precisamos redescobrir as alegrias, o grande privilégio e responsabilidade de sermos pastores e pastoras de pessoas, de famílias, de comunidades... e vendo nessa atividade o “ápice” de qualquer ministério pastoral e espiritual.

Precisamos redescobrir as alegrias, o grande privilégio e responsabilidade de nos encontrarmos nos Concílios Distritais, Regionais e Nacional não para participarmos apenas da política eclesiástica (inclusive a eleição de bispos) e, às vezes, até de manipulações e conspirações de grupos. Precisamos viver Concílios para celebrar o que Deus tem feito em nós e através de nós, e sobretudo para ouvirmos coletivamente e como corpo deliberativo a voz de Deus, até que sejamos convencidos do caminho que Deus quer que a gente ande por ele.

Nos dois Concílios Nacionais que tive a oportunidade de ir, não tive o privilégio de discutir Missões, pois tudo gira em torno de eleição de bispos e bispas. No Concílio acontecido em Belo Horizonte eu propus com a maior cara de pau que a gente elegesse logo os bispos no primeiro dia, pois teríamos a liberdade de discutir os desafios missionários da Igreja. Fui repreendido duramente pela grande maioria, supostamente porque a igreja tinha de aprovar seu plano de trabalho para o qüinqüênio e só então eleger as pessoas mais adequadas para executar aquele plano. Eu reconheço que deveria ser assim, mas avalio que não é. Nada se fala, discute, pensa, propõe, etc, etc, etc, num Concílio Nacional sem que a discussão de eleição de bispos esteja por trás.

Eu ainda me lembro do último Concílio aqui da I Região, o que antecedeu ao último Concílio Geral. Havia em todo canto grupos conversando e até conchavando politicamente a eleição de alguns delegados(as) previamente definidos porque eles seriam eleitores desse ou daquele candidato a bispo(a). Eu tive a oportunidade de denunciar a hipocrisia de alguns que participavam das orações para que Deus abençoasse e dirigisse as eleições ao mesmo tempo que tinham em mãos a lista feita por integrantes e também lideranças de 2 ou 3 distritos com nomes previamente definidos para todos os cargos em disputa.

Ou oramos sinceramente e não fazemos as listas dos conchavos,
ou não oramos e permitimos as listas,
ou oramos e deixamos que as pessoas se associem livremente para as tais eleições.

O que não podemos é permitir a hipocrisia de alguns que se portam incovenientemente e afirmam que tudo o que fazem é santo, é de Deus. Não podemos usar o nome de Deus em vão, diz-nos o segundo Mandamento. Tenho estremecido ao ler os capítulos de Ezequiel sobre a responsabilidade dos pastores.

Já tive oportunidade de propor em dois Concílios Nacionais que o mandato dos Bispos fosse de no mínimo 10 anos, e que entre um Concílio Nacional com eleição de Bispo e outro, tivéssemos a oportunidade de ter Concílios Nacionais para discutir Missões.

Temos quantas cidades em nosso país onde não existe uma igreja Metodista?
Por que ainda não temos um programa de TV em rede nacional em horário nobre?
Por que nossas instituições de ensino andam capengando, quase sempre à beira da falência?
Por que ainda não temos trabalho metodista na Guiana Francesa (esse território francês é único “país” na América do Sul onde não há uma igreja metodista)?
Podemos elaborar um plano de ação onde a Igreja incentive seus membros a produzirem cultura, não necessariamente religiosa, mas com os conteúdos do Evangelho? Etc, etc...

Lamento que as sucessivas eleições e reeleições supostamente coloquem os Bispos eleitos como refém de grupos dentro da Igreja. Esse processo, ao meu ver, tira a autoridade do bispo, pois para ele dar continuidade ao seu trabalho, digamos, ele tem de estar permanentemente em estado de “campanha eleitoral” (e digo isso com temor e muito respeitosamente), não podem desagradar seu eleitorado com a disciplina eclesiástica e espiritual necessárias, quase sempre composto por pastores e pastoras que desejam ser bispos e bispas... É como a história de um funcionário de uma instituição que foi demitido e que para se vingar, tanto fez que acabou sendo eleito para o conselho diretor da tal instituição com a finalidade de pedir a cabeça do diretor que o demitiu...

Estou numa fase da minha vida que sinceramente não me importa quem seja o Bispo colocado sobre a minha vida ministerial, desde que seja um homem ou uma mulher de Deus. Importa é que Deus esteja na direção da Igreja. A Igreja local é um alívio e uma recompensa para o pastor(a) fiel, de fato. Mas se não tivermos bons bispos e bispas, sinceramente, não teremos boas igrejas também, porque o caráter pecaminoso de alguns líderes, acobertado por uns e outros, acabam disseminando a falta de temor e de santidde, bem como a consequente divisão no corpo de Cristo.

E hoje eu me sinto uma pessoa grata e abençoada pessoal e ministerialmente pelo nosso Bispo Paulo Lockmann. Meu candidato a Bispo será o Bispo Lockmann, até que Deus mude isso no meu coração ou que o Bispo diga que não deseja mais ser reeleito. Mas hoje eu sou um pastor que me declaro leal ao meu Bispo. Quantas vezes eu tiver oportunidade de votar, o meu primeiro e certeiro voto será para o Bispo Lockmann, cujo consolidado episcopado tem sido um grande facilitador para quem quer ser pastor. Ao Senhor toda honra e glória pela vida do Bispo da I Região Eclesiástica.

Não, não desejo ser bispo. Desejo ardentemente trabalhar na Igreja Local e em Missões. Uma igreja em cada cidade e em cada bairro, um grupo de discipulado em cada rua, é nisso que eu acredito. Precisamos espalhar a santidade bíblica por toda terra, ao mesmo tempo em que precisamos reformar a igreja para que esta possa reformar a nação. Precisamos ser uma igreja relevante na comunidade onde nossas Igrejas locais estão; nos bairros e cidades e nacionalmente também.

Precisamos redescobrir a alegria, privilégio e responsabilidade de sermos pastores e pastoras qualificados em uma igreja local, sem com isso negar a urgente necessidade da discussão de ministérios específicos para pastores e pastoras.

Mudar a cultura... desejar mais ardentemente o apostolado, o pastorado, o mestrado, o envio, a paixão pelas almas perdidas... uma igreja em cada cidade e bairro, um grupo de discipulado em cada rua... um milhão de discípulos só no Estado do Rio. Uma grande e relevante Igreja Metodista em cada uma das mais de mil favelas só da cidade do Rio de Janeiro...

Pela terceira vez Jesus lhe perguntou: Simão, filho de João, tu me amas? Pedro entristeceu-se por ele lhe ter dito, pela terceira vez: Tu me amas? E respondeu-lhe: Senhor, tu sabes todas as coisas, tu sabes que eu te amo. Jesus lhe disse: Apascenta as minhas ovelhas. (João 21:17)