23 dezembro, 2008

Combate o bom combate da fé

UMESP - Faculdade de Teologia da Igreja Metodista
Sermão do Culto do Envio – Turma 2008

Sermão Pregado pelo Bispo Emérito Paulo Ayres Mattos
12 de Dezembro de 2008

“Combate o Bom Combate da Fé” 1 Timóteo 6. 3-12a

I) INTRODUÇÃO:

a. 1 Timóteo 6. 3-12a apresenta o mesmo o tom e conteúdo da seção inicial da carta

b. A epistola é escrita com o objetivo de que fábulas e genealogias com aparência, formade santidade e de piedade não sejam mais ensinadas entre os efésios, mas que antesseja promovido o serviço de Deus na fé sem hipocrisia

c. As orientações finais de Paulo a Timóteo são no sentido de corrigir aos falsos mestres,estabelecer critérios sadios para o exercício da liderança cristã e conselhos aosmembros ricos da comunidade de Éfeso sobre temas relacionados com o zelodoutrinal, o zelo pela piedade cristã e os perigos do uso do dinheiro como parteintegrante da conduta verdadeiramente cristã

d. O que surpreende nesta perícope é a relação intrigante entre “ensino de outradoutrina”, “piedade misturada com ganância” e “amor ao dinheiro”

- um círculo que se fecha ao interligar esses três temas vigorosamente repudiadospelo autor da epístola

• falsas doutrinas

• falsa piedade

• e a relação causal entre falsas doutrinas e falsa piedade com a ambiçãoincontrolável pela acumulação de bens materiais entre cristãos

II) EXPOSIÇÃO DO TEXTO

- 6. 11-12a, 20a:
“Tu, porém, ó homem de Deus, foge destas coisas... Combate o bom combate dafé... guarda o que te foi confiado...”

A exortação do velho pastor evidencia que há uma luta de poder pelo controle da Igrejaem Éfeso, onde se propagam falsas doutrinas sob falsa piedade, motivadas e cultivadasna comunidade pelo amor ao dinheiro:

a. A disseminação de falsas doutrinas por “certas pessoas”, especialmente dentre aliderança da comunidade, com gananciosos propósitos que vilipendiam a verdadeirapiedade evangélica2

b. Com o apoio de gente da própria comunidade que já era rica (os ricos de 6.17-19) e degente que queria enriquecer a qualquer custo (os aspirantes a ricos de 6.9)

c. Com o objetivo de preservar o poder e o controle sobre a comunidade de Éfeso parausufruto de privilégios e prestígio

d. Não lhes importando quais podiam ser as conseqüências danosas sobre as vidas doscrentes em geral, tanto do ponto de vista espiritual como material

e. Paulo ao longo desta epístola usa palavras muito fortes para suas orientações aTimóteo:

- “Exorto”, “recomendo”, “ordeno”, “encarrego”, “quero”, “honra”, “guarda”

• Expressões que definem a outorga de um mandato dentro de relações mútuas,recíprocas, de fidelidade

f. “Tu, homem de Deus”: Timóteo, “Aquele que honra a Deus”, em oposição a “certaspessoas”, “alguns”... que ensinam falsas doutrinas e manifestam uma falsa piedadecom objetivo de “acumular tesouros na terra”

g. “A boa confissão que fizeste”: confissão feita quando da ordenação de Timóteo pelopresbitério da Igreja, confirmando o chamado divino que lhe foi revelado medianteprofecia, para exercer seu ministério sob o paradigma da vida e missão do próprio Cristo

h. “Combate o bom combate da fé”: Em fidelidade ao mandato recebido do próprioDeus

i. “Guarda o mandato imaculado, irrepreensível, até à manifestação de NossoSenhor Jesus Cristo. ...” “Guarda o que te foi confiado...”: depósito de um bem muito valioso entregue em confiança mútua para ser preservado na sua integralidade

“FOGE DESTAS COISAS!”

Que “coisas”?

- 6. 3-4:
“Se alguém ensina outra doutrina e não concorda com as sãs palavras denosso Senhor Jesus Cristo e com o ensino segundo a piedade...”

a. A primeira advertência de Paulo a Timóteo em suas orientações finais tem a ver com aresponsabilidade do pastor em defender o ensino cristão contra fábulas e genealogias difundidas por falsos mestres cristãos, guardando

- “as sãs palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo” – “palavras salutares” – “palavrasde salvação” – a importância da saúde doutrinária no caminho da salvação

- “o ensino segundo a piedade” – a importância da saúde espiritual no caminho dasalvação – o Evangelho libertador produz necessariamente um estilo de vidatransformado e transformador

A relação intrínseca entre salvação e saúde

b. Contra o “outro ensino” – o “desvio da fé” – de “certas pessoas”

 No mundo greco-romano, filósofos andarilhos perambulavam de cidade em cidadedifundindo suas idéias cobrando de seus ouvinte as palestras proferidas e quandomaior o seu sucesso maior o seu preço

 No final do primeiro século e princípio do segundo pregadores cristãos passaram aimitar os mestres andarilhos, manifestando forma de piedade, mas negando-lhe opoder, com o intuito de se enriquecerem

 Alguns desses mestres acabaram por se estabeleceram na Igreja em Éfeso: sãomestres que ensinam “outra doutrina”, diferente da do autor da epístola, com o apoiode certos ricos, particularmente mulheres ricas (conforme Elsa Tamez, em seuexcelente comentário sobre a primeira carta a Timóteo) , como meio de manter seusprivilégios e vantagens no meio da comunidade cristã

 O autor da epístola apresenta uma caricatura estereotipada d e um falso mestre queprocurava se beneficiar da boa-fé das pessoas crentes em Éfeso, mediante fortedenúncia e solene advertência

• “É enfatuado” – orgulhoso, vaidoso – “vaidade é o meu pecado preferido”: AlPacino em o “Advogado do Diabo”

• “Nada entende” – pensam que muito sabem, mas são totalmente ignorantes –“pretendendo passar por mestres da lei, não compreendendo, todavia, nem o quedizem, nem os assuntos sobre os quais fazem ousadas asseverações” (1.7)

• “Tem a doença das intermináveis controvérsias sobre palavras” – estão enfermosAs sãs palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo em oposição às doentiascontrovérsias de palavras dos mestres que ensinam “outra doutrina” – saúdedoutrinária versus enfermidade doutrinária

• “que se deixam privar da verdade” – consciente e intencionalmente suas mentescorruptas constroem falsas doutrinas visando unicamente seu proveito próprio

 Esta descrição está em aberta contradição com o objetivo da epístola que visa o“amor que procede de coração puro, e de consciência boa e de fé sem hipocrisia”(1.5)

 Tudo isto termina por causar grande dano à vida da comunidade cristã dos efésiosmotivada por tais homens cujo objetivo é fazer da piedade fonte de lucro

- 6. 5: “Supondo que a piedade é fonte de lucro.”

a. “parismós”: “fonte de lucro”

 negócio vantajoso

 motivado por torpe, sórdida ganância

 exercidos não por homens que “honram a Deus”, mas por “mercadores do Evangelho” (Ap. 18.15)

 têm aparência (forma) de piedade, “negando-lhe, entretanto, o poder”, portanto,uma falsa piedade com o interesse de ganhar dinheiro, com a intenção de “ficar rico”

 no fundo pregam um evangelho de acordo com as conveniências e interesses de seusouvintes, principalmente, ao que tudo indica, aos ricos e aos queriam se tornar ricos,que podiam recompensar-lhes sua “fidelidade” com altas quantias em dinheiro

 Em resumo: piedade como negócio, motivada pela ganância, como meio de ganhardinheiro, para “ficar rico”, geralmente mediante corruptos expedientes

• Riqueza como instrumento de poder e controle sob a comunidade da fé, tantodaqueles que corrompem como daqueles que se deixam corromper, vilipendiando o Evangelho, fazendo mercadoria daquilo que é Graça

b. Esses mestres, mercadores do Evangelho, ensinam um “outro tipo de piedade”, e não apiedade a partir do “ensino de Nosso Senhor Jesus Cristo”

 Não a piedade do “genuíno modo de ser cristão”, de ser “nova criatura em Cristo”,que implica necessariamente na relação cotidiana de amor, e somente amor, comDeus e com o próximo, relações essas de amor que em Wesley foram expressas namanifestação cotidiana das obras de piedade e das obras de misericórdia, de andarcom Cristo e como Cristo, no caminho da salvação em direção à perfeição cristã

 Mas antes fazer da piedade cristã um meio de enriquecimento, um meio de negócio;portanto, além de negação da verdadeira piedade evangélica é também grande heresiacontra as sãs palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo

• Mesmo sem desprezar-se a intrínseca relação entre doutrina sadia e piedade sadia,é de se notar que heresia aqui mais do que algo que vai contra a reta doutrinaevangélica (contra a ortodoxia), é algo que vai contra a reta prática evangélica (contra a ortopraxis):

“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, masaquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos, naqueles dias,hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós profetizado emteu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fizemosmuitos milagres? Então, lhes direi: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, osque praticais a iniqüidade.”

 A denúncia do autor da epístola deve necessária e obrigatoriamente nos levar a umasadia suspeita de todas as circunstâncias onde este tipo de “promiscuidade religiosa”entre aparente piedade e o gosto pelas vantagens financeiras, às custas das sãspalavras de Nosso Senhor Jesus Cristo, tão comuns em nossos dias, inclusive emcertos setores da Igreja Metodista, esteja sendo o critério para o sucesso pastoral e motivação para o crescimento numérico das igrejas, com seus conseqüentes ganhosfinanceiros

- 6. 6:
“Certamente a piedade é um grande negócio para se contenta com o quetem.”

a. “Contentamento” – autarkeias – “auto-suficiência”

 “Contentamento” – Termo comum nos ambientes estóicos do mundoneotestamentário que significa independência e desprendimento humanos das coisasmateriais, uma disposição do mais profundo do ser

 Na literatura paulina, entretanto, “contentamento” recebe uma dimensãoprofundamente evangélica pois o coloca como resultante da profunda dependência doser humano da Graça de Deus manifesta em Jesus Cristo, onde contentamento nãoestá sujeito à segurança passageira e instável das circunstâncias terrenas por melhoresque sejam. A Graça como fundamento do contentamento cristão é que leva a Pauloproclamar:

“Aprendi a viver contente em toda e qualquer situação. Tanto sei estarhumilhado como também ser honrado; de tudo e em todas as circunstâncias, já tenho experiência, tanto de fartura como de fome; assim de abundânciacomo de escassez; tudo posso naquele que me fortalece.” (Filipenses 4. 11-13)

É nesta, e somente nesta dimensão de contentamento, em toda e qualquer situação,que se pode declarar: “tudo posso naquele que me fortalece”, muito ao contrário domodo que tão comumente se apregoa hoje nos meios evangélicos como “amuleto”para obter à força o favor divino para prosperidade material e financeira

b. Na genuína suficiência cristã a razão do contentamento é a confiança na inabalávelprovidência de Deus que nos capacita a:

 não ficar obcecado por ter mais e mais dinheiro e ter cada vez mais ganhos evantagens materiais

 buscar viver uma vida mais modesta do que buscar acumular sem cessar bensmateriais

c. “Contentamento” é oposto ao “amor ao dinheiro”, oposto a toda cobiça, ganância eavareza, mas não oposto à satisfação das necessidades de condições de vida justas, dignas e decentes para si e os seus, como muito bem ensina John Wesley em seus sermões sobre o uso do dinheiro

d. “Contentamento” oposto a fazer-se do ministério um meio de enriquecimento e deusufruto de privilégios à custa da “carne” das ovelhas, mas não oposto à remuneraçãojusta do ministério pastoral daqueles que são fiéis e dignos no exercício de suavocação

e. Contentamento: um salutar desprendimento de qualquer ambição que façaequivocadamente do bem-estar material a garantia e segurança de nossa relação e6compromisso com Deus, com o Evangelho e com chamado divino para servir ao Povode Deus

 Contentamento: Compromisso ministerial motivado pelo amor “ágape” no serviço aDeus em favor das pessoas, em particular dos pequeninos de Deus

f. Contentamento que nos leva a repudiar todo o evangelho que sutilmente legitima esacraliza, como nas teologias da prosperidade, toda ganância material e financeiranesta vida presente como prova da fidelidade de Deus, reduzindo a declaração “Deus éFiel” a um slogan mercadológico e a invocação do “nome de Jesus” como “vãrepetição” de um supersticioso mantra nada cristão

g. Contentamento que dá autoridade espiritual e moral para corrigir e orientar os cristãosricos no uso generoso e altruísta do dinheiro, como mordomos de Deus, colocando-oao serviço de Deus e dos pobres mediante as boas obras, não colocando jamais suasegurança na instabilidade das riquezas terrenas, conforme 6. 17-19

- 6. 7:
“Porque nada temos trazido para o mundo, nem cousa alguma podemoslevar.”

a. Todo bem material que temos ou venhamos a ter se esgota neste lado da vida humana,pois se limita ao nosso nascer e morrer, portanto, seu valor, por mais importante quenos seja, é extremamente transitório, instável e provisório, pois, nada trazemos a estemundo e nada dele levaremos, a não ser uma mortalha, um caixão e uma sepultura

b. A razão de nosso contentamento, portanto, não se procede de bens materiaistransitórios e instáveis, mas da fidelidade de Deus, pois como nos adverte o próprioSenhor Jesus Cristo:

“Não acumuleis para vós outros tesouros sobre a terra, onde a traça e aferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam; mas ajuntai para vocêsoutros tesouros no céu, onde traça nem ferrugem corrói e onde ladrões nãoescavam, nem roubam; porque onde está o teu tesouro, aí estará o teucoração.”

- 6. 8:
“[Mas] tendo alimento, vestimenta [e moradia], estejamos contentes.”

a. Notemos, antes de tudo, que no original grego a necessidade da moradia está incluídana expressão traduzida em português “com que nos vestir”

b. Mesmo que o autor da epístola mais uma vez esteja citando a sabedoria de seu tempo,a verdade é que o paradigma de nossa relação com coisas materiais, comida,vestimenta e abrigo, é o próprio Cristo

• O autor da epístola não está desprezando o fato de que temos necessidades básicasque precisam ser devidamente atendidas e satisfeitas, como aconteceu com as dopróprio Cristo, que foi assistido em suas necessidades materiais, inclusive, pelosbens de algumas santas mulheres que deviam ser ricas, conforme o testemunho doevangelista Lucas, o evangelista dos pobres

• No entanto, deixa claro que contentamento, no que diz respeito a taisnecessidades, nada tem a ver com os objetivos propagados por todo ensino sobreprosperidade material e financeira das teologias neopentecostais modernistas, inclusive entre nós metodistas, que a enfatizam como sinal do favor divinoreservado aos que “estão na bênção”, num humanismo exacerbado e tresloucadoensinado pela teologia da confissão positiva

c. De fato, na visão do autor da carta, poder aquisitivo tem pouco, ou nada, a ver compiedade e santidade evangélicas

d. Como podem cristãos e cristãs viver decentemente de forma simples e modesta comcontentamento, tendo suas necessidades básicas plenamente atendidas, semsucumbirem à ganância e utilitarismo característicos de uma sociedade materialista econsumista como a dos nossos dias, onde o deus mercado passou a ser a medida detodas as coisas, inclusive da religião?

• O ensino apostólico é claro que não é reproduzindo os modelos dominantes emnossas sociedades construídos a partir da ambição e egoísmo humanos e que emnossos dias têm se constituído no paradigma para muitos cristãos e igrejas com suaênfase no pseudo-evangelho da prosperidade

- 6. 9:
“Ora, os que querem ficar ricos caem em tentações, e ciladas, e em muitasconcupiscências insensatas e perniciosas, as quais afogam os homens na ruína eperdição.”

a. O desejo obsessivo de muitos cristãos em “ficar rico”, em acumular riquezas, é um fogo que se auto-alimenta, consumindo não somente tempo e energia, mas, pior, devorando e destruindo os valores do Reino de Deus

 Em nossos dias, não se sabe o que é mais difícil: se resistir ao amor ao dinheiro comomotivação maior em nossa sociedade materialista e consumista ou se resistir ao amorao dinheiro exposto nas racionalizações pseudocristãs das teologias da prosperidadeque dominam muitos setores do mundo evangélico brasileiro, inclusive entre muitosmembros metodistas, tanto em seu pastorado como em seu laicato

 Na visão do autor da epístola, o desejo de possuir mais e mais bens materiais aoinvés de produzir felicidade e bem-estar produz, sim, ruína e perdição, portanto,mais do que uma questão relacionada com a ética cristã, é uma questão soteriológica,que afeta diretamente a nossa salvação

 A tragédia exposta nesta altura de nosso texto é que obstinação em ficar rico é umaestrada que acaba por descambar para toda sorte de destruição espiritual e moral

 O termo decisivo neste versículo é “peirasmós” que em nossas traduções geralmenteaparece como “tentação de”, dando um caráter passivo à agência humana na tentaçãodo “desejo de ficar rico”

• Contudo, há exegetas que entendem que o termo traz em si uma dimensão muitamais ativa e intencional da participação humana no “desejo de ficar rico”

• Mais do que “tentação de” é “tentação a”, isto é, “tentar a Deus”, como osisraelitas fizeram no deserto, conforme encontramos em Êxodo 17.7 e Salmo 95.8-10, onde o que está em jogo é o pecado da idolatria, isto é, atribuir a Deus o que aunicamente lhe pertence, portanto, o maior pecado contra Javé: “Não terás outrosdeuses diante de mim...”

o O confronto dentre Javé e o “bezerro de ouro” – apostasia idolátrica em buscarsegurança em outras fontes de segurança que não Javé

Deus permite que o provemos, mas não admite que o tentemos, quedesafiemos sua fidelidade, pois suas conseqüências são trágicas, já quesó Javé é Senhor!

o No dizer do autor da epístola, idolatria seria então “amor ao deus dinheiro” –nas palavras de Jesus adoração (servir) a “Mammon”, o deus da riqueza(Gregório de Nissa chega a identificar Mammon com o próprio diabo-belzebu)

“Ninguém pode servir a dois senhores; porque há de aborrecer-se deum e amar ao outro, ou se devotará a um e desprezará ao outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas.”

o A tentação a Deus, na prática idolátrica do “amor ao dinheiro”, advém do fatoque o dinheiro, as riquezas, podem adquirir o caráter de “encantamento”, desedução, como no Jardim do Éden, prometendo segurança que não podeoferecer, mas que se chega ao ser humano como um “anjo de luz”

• Portanto, o desejo obsessivo de “ficar rico” é de fato cair na tentação de testar afidelidade de Deus em seu compromisso como o Deus da vida, uma ofensa abertacontra Deus, pois se recusa a viver somente sob e mediante a Graça de Deus

• O “amor ao dinheiro” conduz a pessoa a se envolver em situações em que asregras do jogo muitas vezes têm a ver com corrupção de toda sorte, em que osvalores da piedade próprios do Evangelho são completamente ignorados e atémesmo negados

“Louco, esta noite pedirão a tua alma, e o que tens preparado paraquem será?”

o Wesley descreveu tais riscos de maneira pungente em seus sermões sobre o usodo dinheiro (Particularmente os sermões 19, 21-30, 50, 61, 68, 78, 87, 108, 122,125, 131)

- 6. 10:
“Porque o amor ao dinheiro é raiz de todos os males; e alguns, nessacobiça, se desviaram da fé e a si mesmos se atormentam com muitas dores.”

a. “Amor ao dinheiro raiz de todos os males”: expressão bem conhecida no mundogentílico do primeiro século do cristianismo – crítica social contra os ricos que não sepreocupavam com o bem-estar da “polis”, buscando promover a benemerência paracom os pobres na promoção de seu poder e prestígio sociais

b. “Amor ao dinheiro raiz de todos os males”: crítica social do cristianismo contra osricos que não se preocupavam com o bem-estar dos pobres (Mateus 25. 31-46, e Lucas16. 19-31), como expressão do amor a Deus e ao próximo

c. “amor ao dinheiro”: amor ao dinheiro (philarguiría) em aberta oposição aocontentamento (autarkeias )

 “amor ao dinheiro” como “anelo veemente” por “ficar rico”

 “amor ao dinheiro” não se coaduna com a piedade que advém da convivência comJesus Cristo

• não manifesta o comportamento adequado de um seguidor de Nosso Senhor JesusCristo, pois busca no dinheiro como fonte de segurança, poder e prestígio e sinalde sucesso pessoal

 “amor ao dinheiro como raiz de todos os males” como enfermidade• oposto à fé cristã – exclui o amor a Deus

• em desacordo com a verdadeira piedade cristã – exclui o amor ao próximo

 “amor ao dinheiro” – uma questão soteriológica:

• “afogam os homens na ruína perdição”

• “desvio da fé”

• “tormentos com muitas dores”

- 6. 11-12a:
“Tu, porém, ó homem de Deus, foge destas coisas... Combate o bomcombate da fé... guarda o que te foi confiado...”.

 A vida sob os valores da piedade própria aos valores do Reino de Deus écaracterizada não pelo montante de possessões materiais que se possa ter, mas peloexercício e prática constante e disciplinado da:

• Justiça e Piedade: Nas palavras de Wesley, a prática das obras demisericórdia e obras de piedade

• Fé e Amor: Cristianismo prático no amor a Deus e ao próximo,alvos da santificação como perfeição cristã, a restauração daimago dei

• Constância e Mansidão: Firmeza tranqüila em toda e qualquercircunstância humana

III) CONCLUSÃO

Voltemos ao início de nossa mensagem:

a. As orientações finais de Paulo a Timóteo são no sentido de:

 corrigir o ensino dos falsos mestres, segundo as sãs palavras de Jesus Cristo

 estabelecer critérios sadios para o exercício da piedade cristã

 aconselhar aos membros ricos da comunidade de Éfeso sobre temas relacionadoscomo o zelo doutrinal, o zelo pela piedade cristã e os perigos do uso do dinheiro,como parte integrante da conduta verdadeiramente cristã

b. O surpreendente nesta perícope é a relação intrigante entre “ensino de outra doutrina”,“piedade como ganância” e “amor ao dinheiro”

 um círculo que se fecha ao interligar esses três temas vigorosamente repudiadospelo autor da epístola

• falsas doutrinas

• falsa piedade

• a relação causal entre falsas doutrinas e falsa piedade com a ambição incontrolável pela acumulação de bens materiais entre cristãos, o “amor aodinheiro”

c. Como homens e mulheres de Deus, a quem nos tem sido confiado o pastoreio dorebanho de Cristo, somos chamados a exercer nosso ministério em obediência aomandato e ao depósito que Cristo colocou em nossas mãos no cuidado da sã doutrina eno exercício da sadia piedade

d. Acontece que, assim como nos tempos apostólicos, em nossos dias estamos sendoameaçados por um demônio que não se manifesta de forma aberta e violenta, mas,sim, de forma sutil e encantadora, o demônio do “amor ao dinheiro”, que tem levado oministério pastoral a se afastar do contentamento que a superabundante Graça de Deusnos oferece e buscar obsessivamente segurança na transitoriedade e instabilidade daacumulação de bens materiais

e. A obra demoníaca do “amor ao dinheiro” coloca em risco na vida de nossascomunidades de fé o ensino da sã doutrina do Senhor Jesus e a prática humilde dasadia piedade cristã

f. Resta-nos, em nome do Deus Trino, como ministros do Evangelho, no ensino da sãdoutrina e na prática da sadia piedade cristã, resistir tal obra demoníaca, buscando viver em busca da vida de santidade em santidade de vida

Renovação do Pacto com Deus
(Estabelecido por John Wesley em 1755)

CONVITE À RENOVAÇÃO DO PACTO COM DEUS: Amados e amadas em Cristo,firmemos novamente este Pacto que Deus estabeleceu com o seu povo, e tomemos o jugo de Cristo. Tomar este jugo significa que estamos contentes por Ele nos indicar ocaminho e o nosso trabalho, e ser Ele próprio a nossa recompensa. Cristo tem muitosserviços para serem feitos: alguns são fáceis, outros são difíceis, alguns trazem honraoutros trazem rejeição, alguns estão de acordo com as nossas inclinações e interessesmateriais, outros são contrários a ambos; em alguns podemos agradar a Cristo e a nóspróprios, noutros não podemos agradar a Cristo a não ser que nos neguemos a nós próprios. O poder para fazermos estas coisas é-nos dado por Cristo que nos fortalece. Por isso renovemos este nosso Pacto com Deus. Entreguemo-nos a Ele acreditando nassuas promessas e dependendo da Sua Graça.

ORAÇÃO:
Senhor Deus, Pai Santo, que nos chamaste através de Cristo para partilharmoseste gracioso Pacto, tomamos com alegria o jugo da obediência e, pelo Teu Amor, comprometemo-nos a reverenciar-Te e a fazer a Tua vontade. Não somos mais nossos, masTeus. Não sou mais meu, mas Teu. Coloca-me onde Tu quiseres, no lugar que Tu quiseres,para trabalhar ou para sofrer, exaltar-me ou humilhar-me; usa-me ou põe-me de lado,enche-me da Tua Graça ou priva-me dela, dá-me todas as coisas ou não me dês nada; tudoponho nas Tuas mãos. E agora, bendito e glorioso Deus, Pai, Filho e Espírito Santo, Tu és meu e eu sou Teu. Assim seja. E que este Pacto agora feito na terra, seja ratificado no Céu.
Amém.

Os (verdadeiros) símbolos do Natal (Luiz Carlos Ramos)



(Cf. Lucas 2.8-20 e Mateus 2.1-11)

O tempo do Natal é um tempo simbólico. As narrativas evangélicas do Natal destacam alguns sinais que marcaram o grande evento pelo qual a glória de Deus visitou a humanidade na simplicidade de uma criança recém nascida.

A narrativa evangélica do Natal de Jesus começa fazendo referência aos pastores que viviam a céu aberto. Esses trabalhadores do campo foram os primeiros a ver no céu o sinal da salvação porque não tinham um teto sobre sua cabeça. Ao que parece, a mensagem do Natal nos nossos dias, para sermos fiéis ao primeiro Natal, deveria alcançar em primeiro lugar os que estão desabrigados, os sem-teto, os sem-terra, os andarilhos, os vigilantes, os porteiros, os que trabalham no sereno ou se revezam nos turnos da noite, e todos aqueles e aquelas que passam as noites sob as estrelas, à espera de uma boa nova de salvação.

Anjos mensageiros povoou o céu na noite do Natal de Jesus, e diz ainda que eles anunciavam uma boa notícia que glorificaria a Deus no céu e traria paz à terra. Os anjos eram mensageiros, portadores de notícias e informações importantes. Ora, os portadores das notícias que nos chegam hoje são os carteiros, os officeboys e os motoboys; são também os jornalistas, repórteres e todos os profissionais que se arriscam para nos trazer informações. Anjos, portanto, são todos aqueles homens e aquelas mulheres que em algum momento nos trazem boa nova que dão alegria, informações que de alguma forma glorificam a Deus e trazem paz à terra.

Maria fora escolhida para ser a mãe de Jesus. Ser mulher e ser pobre, por si só, já significa ter de enfrentar preconceitos e discriminação. No caso de Maria, havia um agravante: além de ser pobre, ela ficou grávida antes de se casar. Se hoje isso já é motivo para muito sofrimento e humilhação, imagine-se essa situação nos tempos bíblicos. Mesmo assim, os pastores foram orientados a procurar por uma mulher que acabara de dar à luz uma criança, porque isso lhes serviria de sinal de que ali encontrariam a salvação. Aprendemos com o Evangelho que uma mulher grávida ou que acaba de dar à luz é mais um dos maravilhosos símbolos do Natal. Seríamos nós capazes de tratar as mulheres grávidas e, em particular, as mães sozinhas e pobres, como portadoras privilegiadas da salvação?

É impossível separar as personagens enigmáticas dos “Magos que vieram do Oriente” do cenário natalino. Desperta-nos a curiosidade o fato de que a criança de Belém se constitui em ponto de encontro de parentes e vizinhos, mas também de desconhecidos e estrangeiros. Sendo do Oriente e sendo magos, esses senhores não professavam a religião de Israel. Observadores de astros, eram uma mistura de astrônomos e astrólogos, meio cientistas e meio feiticeiros. Ainda assim, são recebidos pela família do Salvador. Seria o encontro, aproximação e diálogo entre as diferentes religiões mundiais um dos símbolos do Natal? Os nossos dogmas adultos nos afastam, mas o Deus menino nos aproxima. Não precisamos concordar em tudo, nem acreditar nas mesmas coisas, mas podemos nos encontrar para servir a Deus no serviço uns dos outros, servindo até mesmo aos que não crêem.

Uma “manjedoura” serviu de berço para Jesus, um coxo que servia para alimentar os animais. Um bebê rodeado por animais domésticos, selváticos e mesmo de animais selvagens, coexistindo de forma pacífica, faz parte da tradição messiânica, segundo a qual “o lobo habitará com o cordeiro, e o leopardo se deitará junto ao cabrito; o bezerro, o leão novo e o animal cevado andarão juntos, e um pequenino os guiará.” (Is 11.6-7). E não haveria paz só em relação aos animais, mas em relação a todo o meio ambiente: “Não se fará mal nem dano algum em todo o meu santo monte, porque a terra se encherá do conhecimento do SENHOR, como as águas cobrem o mar” (Is 11.9). O respeito pelos animais, quer sejam domésticos, selváticos ou selvagens, e o cuidado da natureza em geral, sim, esse respeito e esse cuidado fazem parte da essência da mensagem do Natal.

Mas o maior de todos os símbolos bíblicos do Natal é a criança. Os pastores foram orientados a procurar “uma criança envolta em faixas e deitada em manjedoura” (Lc 2.12), e este seria para eles o grande sinal de que estavam diante do “Salvador, que é Cristo, o Senhor” (Lc 2.11). Essa criança não tinha berço, nem usava trajes nobres. Contudo, trazia dentro de si um amor tão grande, que foi capaz de salvar o mundo. Encontrar Deus no colo de uma mulher só pode ser uma surpresa fantástica. O Natal não nos fala, então, de um Deus furioso, vingativo e violento; ao contrário, ver as crianças como símbolo do Natal é contemplar um Deus terno, um Deus bom, um Deus alegre. Um Deus como você e eu.

FELIZ NATAL!